Enquanto os preços dos imóveis dão claros sinais de desaceleração, o
crédito imobiliário no Brasil continua pisando forte no acelerador. No
primeiro quadrimestre do ano, o volume de financiamentos com recursos da
poupança saltou 20% em relação ao mesmo período de 2013, somando R$
34,4 bilhões.
A escalada é ainda mais expressiva quando se olha o
acumulado de 12 meses até abril deste ano: os empréstimos movimentaram
R$ 114,9 bilhões com recursos da poupança, crescimento de 30% ante o
período anterior, de acordo com a Associação Brasileira das Entidades de
Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).
O número de unidades financiadas também decolou: cresceu 16% nos três primeiros meses do ano, ante igual período de 2013.
Ao
mesmo tempo, os imóveis tiveram queda real de preços – crescimento
menor que a inflação oficial – entre janeiro e maio deste ano, mostrou o
mais recente estudo do Índice FipeZap. Na medida em que o Índice
Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou alta de 3,33% no
período, os imóveis encareceram 2,98%.
“A recente acomodação dos
preços [dos imóveis] estimulou as pessoas a procurarem mais
financiamento para a casa própria”, analisa o especialista em crédito
imobiliário e ex-superintendente da Abecip, José Pereira Gonçalves.
Além
de acreditar que o atual crescimento do crédito não representa riscos
para a economia, Gonçalves sustenta a tese de que o sistema caminha para
se consolidar no Brasil. Em sua visão, contudo, o volume de empréstimos
já alcança um patamar saudável em torno de R$ 100 bilhões ao ano.
Bancos brigam por fatia maior do financiamento habitacional
Maior
credora de imóveis financiados no Brasil, a Caixa Econômica Federal viu
um crescimento robusto de sua carteira de crédito habitacional nos
últimos anos. Dona de 67,6% do mercado, a instituição planeja ampliar
ainda mais essa fatia.
O montante emprestado pelo banco evoluiu
29,1% no primeiro trimestre deste ano em comparação ao mesmo período de
2013, alcançando R$ 284,3 bilhões. A última edição do Feirão da Casa
Própria, ocorrida em maio passado, gerou 11,72% mais recursos que no ano
passado, movimentando R$ 15,6 bilhões.
De olho nesse
crescimento, os bancos privados anunciaram recentemente que vão brigar
para abocanhar clientes para sua carteira de crédito imobiliário, em
detrimento do financiamento de veículos, que historicamente tem mais
risco de inadimplência.
Apesar do retorno menor em juros, os
bancos ganham com a ampliação de sua carteira de imóveis com menos
calotes e a fidelidade do cliente, que permanece por mais tempo devido
ao longo tempo de financiamento.
O prolongamento deste prazo de
30 para 35 anos, encabeçado pela Caixa, também ajudou a incentivar o
acesso ao crédito. Com mais tempo para pagar, a parcela fica menor,
apesar de o valor pago pelo imóvel aumentar.
Na opinião do
economista Adolfo Sachsida, especialista em política econômica, medidas
como esta criam uma demanda artificial pelo crédito. “É como jogar
gasolina na fogueira. Quanto mais se cria incentivos a esses
financiamentos, mais se dificulta o reajuste de preços dos imóveis”,
acredita.
Sachsida considera que o crescimento em torno de 30% do
crédito imobiliário não é saudável diante da lenta evolução do Produto
Interno Bruto (PIB). A relação entre o volume financiado e o total de
riquezas do País, em abril deste ano, estava em 8,6%, em uma curva
crescente desde março de 2007, quando essa relação chegava a apenas
1,62%.
No auge do desequilíbrio financeiro, essa participação
ultrapassou 100% nos Estados Unidos, levando ao estouro da bolha
imobiliária no país, lembra o professor e coordenador do núcleo de Real
Estate da USP (Universidade de São Paulo), João da Rocha Lima.
Relação entre crédito e PIB divide opiniões de especialistas
Quanto
maior a relação entre o volume de financiamentos e o PIB de um país,
maior o risco para a formação de uma bolha imobiliária, sustenta a tese.
Sachsida, contudo, defende que o cenário de crédito nos EUA não pode
ser comparado com o brasileiro.
“Nos EUA há muita poupança porque
o dinheiro do resto do mundo está depositado lá. Isso permite mais
concessão de crédito. No Brasil, o aumento de crédito é artificial,
porque a capacidade de poupança do brasileiro não aumentou na mesma
proporção”, argumenta.
Gonçalves, ex-Abecip, contrapõe o
argumento de que o brasileiro não pode pagar as prestações do imóvel. “A
taxa de juros dos financiamentos imobiliários é a menor do mercado, e
ele é o maior indicador de que a renda é suficiente. Os bancos são
rigorosos e não emprestam para quem não pode pagar”, conclui.
Na
análise do especialista em crédito habitacional, o aumento do prazo nos
financiamentos faz com que as parcelas caibam no bolso do brasileiro,
além da possibilidade de se quitar a dívida antes.
Sachsida,
contudo, considera que o prazo maior dos empréstimos não melhora a
capacidade de pagamento da população. “Isso o incentiva a optar por
imóveis mais caros. O brasileiro sempre olha apenas para o valor da
parcela”, diz.
Fonte: Obra24horas
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