O primeiro trecho do metrô de
Londres foi inaugurado em 1863 – e, com ele, todo um sistema de
transportes revolucionário, que foi exportado para inúmeras partes do
mundo.
Nas décadas que se seguiram, vários mapas foram criados
para ajudar os passageiros a se guiarem pela rede que se ampliava sem
parar. Mas nenhum deles tinha a cara do diagrama criado por Harry Beck
em 1931, que serviu de base para o mapa que hoje é adorado tanto pelos
londrinos quanto por quem visita a cidade.
O fato de ter havido
tantos mapas anteriormente prova que o metrô criou um problema que levou
muitos anos para ser resolvido à custa de muito talento e habilidade.
Afinal
como um designer poderia representar em sua integridade linhas que se
cruzam em alguns quilômetros quadrados do centro da cidade, mas ainda se
estendem a áreas da periferia que, até 1900, eram fazendas, descampados
e vilarejos remotos? E como tudo isso poderia caber em um único espaço
pequeno o suficiente para ser guardado no bolso?
Tamanho é documento
A simples
expansão da rede do metrô tornou seu mapeamento problemático. Até mesmo
no centro de Londres, onde estações como Covent Garden e Leicester
Square ficam a apenas 200 metros uma da outra, enquanto outras como
King's Cross e Farringdon distam de 1,85 quilômetros.
Fora do centro, o metrô se estendia até o condado de Buckinghamshire, a 80 quilômetros.
Como
os mapas da época se baseavam nos conceitos que existiam até então, os
desenhistas acreditavam ser necessário apresentar as distâncias
geográficas em uma escala verdadeira.
Mas até 1930, ficou claro
que qualquer mapa que pretendesse cobrir toda a malha seria sempre algo
grande e pouco prático para se carregar o tempo todo – principalmente
dentro das apertadas estações. Por isso, apenas as estações mais
centrais eram mostradas.
O design feito por Harry Beck em 1931:
a base para todos os futuros mapas desenhados do metrô (Crédito: TfL,
do Museu do Transporte de Londres)
Muitos desses primeiros mapas, projetados por artistas, têm seu charme e
acabaram virando itens de colecionador. Mas os problemas continuavam:
eles não eram abrangentes nem práticos.
Mapa ou Mondrian?
Em 1931,
Harry Beck, um jovem engenheiro projetista que foi admitido nos quadros
da companhia administradora do metrô seis anos antes, apresentou uma
solução.
Seu projeto se tornou não apenas uma ferramenta de grande
utilidade para os passageiros, mas também virou um ícone do design,
servindo de base para os mapas atuais.
Ainda assim, quando Beck
mostrou seu "diagrama" para a direção do metrô, houve quem duvidasse da
eficiência do projeto. Ele continha linhas horizontais, verticais ou em
ângulos de 45 graus. Ignorando a geografia, o mapa parecia o cruzamento
de um diagrama de circuito elétrico com um quadro do pintor holandês
Piet Mondrian.
Beck argumentou que o fato de o mapa não
representar fielmente a distância ou a localização geográfica das
estações não tinha importância: o que os passageiros precisavam saber
era como chegar de uma estação a outra da maneira mais eficiente
possível e onde fazer baldeações.
Em 1933, o metrô, os ônibus e os
bondes da cidade foram unidos sob o guarda-chuva de uma única empresa
estatal, a London Passenger Transport Board.
Com um espírito
modernizador, a companhia aproveitou o momento para testar como o
público responderia ao radical "diagrama" de Beck. Após distribuir 500
cópias em algumas estações em 1932, a empresa decidiu imprimir 700 mil
cópias em 1933.
Foi um sucesso instantâneo, e uma nova impressão teve que ser feita um mês depois.
Racha com estatal
Mas
o mapa não era perfeito, pois Beck não conseguiu incluir algumas
estações mais afastadas. Ao longo dos anos seguintes, ele resolveu
vários quebra-cabeças do design atualizando seu projeto original.
A
última versão desenhada por Beck saiu em 1960, quando ele brigou com a
estatal. A tarefa de seguir desenhando o mapa foi passada para Harold
Hutchinson, representante de publicidade da companhia.
Vendo sua criação nas mãos de outra pessoa, Beck entrou com um longo
processo judicial contra a London Transport. Ele desistiu da causa em
1965. Mas até sua morte, em 1974, ele continuou trabalhando com o mapa
em casa, além de ter feito desenhos para o metrô de Paris.
Desde 1986, o design se tornou uma tarefa corporativa. Com exceção de Beck, nenhum outro desenhista é identificado.
Há
muitos anos, o mapa se tornou global, inspirando não apenas inúmeras
plantas de metrôs em vários continentes mas também como um item
onipresente em camisetas, canecas e outros suvenires.
Autêntico design britânico
Isso
significa que, quando há grandes mudanças no mapa, todo o mundo nota.
Nos últimos anos, o projeto foi mudado para abrigar linhas novas como a
Docklands Light Railway e a rede do Overground.
Em 2009, o rio
Tâmisa, que tinha permanecido como um forte elemento geográfico, foi
retirado do mapa. Houve uma grande insatisfação por parte dos cidadãos
de Londres e uma extensa cobertura por parte da imprensa internacional.
Isso
fez com o que o Tâmisa voltasse ao mapa poucos meses depois. O mapa sem
o rio virou um item tão raro que colecionadores são capazes de pagar
uma fortuna por ele.
Em 2006, o mapa de Beck ficou no segundo
lugar em um concurso da BBC no qual 200 mil espectadores elegeram o
melhor objeto do design britânico, entre eles o Mini, o Jaguar E-Type e a
capa do álbum Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles. O
primeiro lugar ficou com o Concorde, talvez o avião mais bonito que já
existiu.
Leia a versão original desta reportagem em inglês no site BBC Culture.
Fonte: BBC Brasil


Nenhum comentário